Nunca tinha visto os olhos de Elza Góis. Ela não levanta a cabeça, quase nunca. Seus produtos estão dispostos em dois assentos de um ponto de ônibus. Os olhos – e as mãos – estão sempre em direção das balas, amendoins, chocolates e chicletes. Ela só levanta os olhos quando trabalha, quando alguém lhe diz boa noite, quando não ouve.
Aliás, quem falou que difícil é entrevistar deputados, cientistas e presidentes? Difícil é entrevistar Elza Góis, que não ouve, não entende e não se faz entender.
É nesse esforço de conversa que você poderá sentir as mãos quentes de Elza, apesar do vento que corre pela avenida Dr. Arnaldo. Sim, ela vai tomar suas mãos e te puxar bem perto pra poder te ouvir. É assim que vai enxergar seus olhos azuis – seriam azuis ou eu é que estava verde de fome? – e ver o rosto mais enrugado que jamais viu.
Quase todos os dias passo por Elza Góis, mas nunca conversei com ela. Sua altura – minúscula – as mãos enrugadas – até a alma. Tudo me transmitia distância.
Mas foi assim que conheci Elza Góis, quando senti fome e decidi comprar amendoins. Minha janta daquele dia.
Elza volta. Quase todos os dias passo por ela.